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Fundadora do Instituto Happiness do Brasil, Sandra Teschner pontua a polarização das emoções, e a formação para a felicidade como uma das chaves para combater a ansiedade que assola os brasileiros.

Felicidade, às vezes, é só uma questão de equalizar as dores e reduzir o que nos consome a alegria. Gente feliz fica com raiva, triste, ansiosa; mas não fica lá

Estamos emocionalmente polarizados, poucos estão bem. Vivemos uma era de super resilientes se contrapondo a ansiosos. De praticantes de mindfulness a nostálgicos profissionais. Transita entre transtornos psicopatológicos, em todo o mundo, uma ciência robusta que oferece saúde física e mental: é possível ser mais feliz com aprendizagem e técnica. Contudo, estamos confusos demais para enxergar a saída: “em tempos difíceis como esses, melhor, não fazer estardalhaço sobre o tema felicidade”. Entenda por quê.

Interessante, instigante, mas real. A frase acima é uma constante até mesmo em empresas que contratam treinamento, palestras e consultoria para implantação de programas de felicidade corporativa; na hora de comunicar ao colaborador ou ao cliente preferem usualmente uma nomenclatura menos happy, uma espécie de eufemismo funcional: “melhor mudar o discurso para não parecer que não estamos entendendo o momento de crise mundial. Falar para ser mais feliz numa hora dessas, pode não pegar bem”.

Por se tratar de uma abordagem relativamente nova (“Psicologia Positiva”, Martin Seligman, 2004), há ainda muito a ser digerido sobre sua aplicabilidade e a falha na comunicação se dá exatamente pelo amplo desconhecimento do que é a ciência do bem estar, ou como outros autores preferem, provavelmente para se precaverem de serem taxados de felizes, a auto ciência ou a ciência do ser integral.

O estudo dos aspectos saudáveis do ser humano é tão relevante quanto os estudos sobre a psicopatologia. Essa foi uma grande contribuição principalmente da neurociência e da psicologia positiva nas últimas duas décadas, “fornecendo outra perspectiva de análise do comportamento humano, ao olhar para o que possuímos de melhor em nós” (Fortes e Ferreira, 2013).

Estudar as características positivas da mente humana é potencializar o otimismo, altruísmo, a alegria, autoconfiança, resiliência, autoestima, esperança. Se podemos medir a doença mental e tratá-la, por que não conseguiríamos mensurar e fomentar o cuidado com a saúde mental? E é nessa resposta que essa ciência encontra seu lastro. (Ed Diener, California University, Right Management RH, Shawn Archor).

Sou insistente. Não só no Instituto Happiness do Brasil, do qual sou fundadora, chama-se Ciência da Felicidade mesmo, como o programa de certificação profissional se chama “Formação de Felicitadores” (Happiness Manager na certificação americana), um estudo de caso defendido por mim para a Must University Florida, que se baseia na premissa que toda pessoa feliz “intencional”, ou seja, aquela que aprendeu a ser mais feliz, está apta a fazer outros mais felizes, conseguindo replicar o conhecimento e a prática adquiridas.

É como colocar em cadência os cérebros pensante e o emocional, termos cunhados pelo professor Daniel Goleman. O intangível contágio dos bem-amados e bem-humorados encontra estudos científicos trazendo práticas e conhecimentos capazes de transformar o comportamento humano e nos afastar dos males mentais que assolam a saúde do indivíduo, por conseguinte, toda a estrutura produtiva e positiva da sociedade.

Felicidade não é positividade tóxica!

Vivemos uma transição. A pandemia mexeu com estruturas mentais já bastante fragilizadas antes dela. Ansiedade já é a terceira maior causa de absenteísmo nas organizações e nós ganhamos a cereja do bolo: vivemos, desde o ano de 2017, no País mais ansioso do planeta, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde.

Assim como a boa forma física eleva a capacidade de viver de forma mais autônoma e disposta, o treino da “musculatura mental” nos capacita a desfrutar dos mesmos atributos. Do aprendizado ao lidar com as emoções às reações que aprendemos a escolher e a formar sentimentos com menor probabilidade de vivenciar ou causar danos.

Nas organizações o alinhamento de valores e necessidades dos colaboradores, aos objetivos da empresa, devem dar a tônica da relação. Segurança mental e promoção de ambientes positivos impactam no lucro das empresas, enquanto desalinhamento entre discurso e práticas pressionam bons profissionais a resignar, um borbulho latente nesse caldeirão ansioso, estressado e carente de elementos que promovam regeneração.

Assumir ações para promover positividade (não confundir com positividade tóxica, que é a versão fake do otimismo genuíno, baseado em esforço e aprendizado) nada mais é do que decifrar os códigos que promovem o bem-estar subjetivo, acionando auto responsabilidade, colocando ordem no ambiente interno, antes de elevar o dialogo à outra parte envolvida. Algo como arrumar a casa, antes de querer mudar o planeta, ou como explica o professor e psicólogo clínico Jordan Peterson no best-seller ’12 Regras Para a Vida’, “Você quer fazer do mundo um lugar melhor? Comece arrumando seu quarto!”, simples e funcional. Grande parte das pessoas que se manifesta por um mundo sustentável, ainda não separa o lixo em casa. Nas centenas de palestras que dou a públicos ecléticos, esta constatação faz parte do clássico momento coletivo mea-culpa.

O improvável ficou mais provável do que costumava ser

A probabilidade de algo improvável acontecer é uma das heranças da pandemia e um fator estressor de ansiedade. Incertezas e saídas de planos são quebras de sistemas. Por outro lado, a antifragilidade, teoria disruptiva inclusive para o mercado de capitais, de Nassim Taleb, encontra paralelos na psicologia positiva.

Segundo Taleb as incertezas são excelentes momentos para prosperar, assim como o crescimento pela dor que algumas pessoas vivenciam, após sofrerem grandes perdas. O antifrágil não é um fenômeno de resiliência onde o corpo pressionado volta a posição inicial, mas que prospera, cresce sob pressão, algo como uma resiliência 2.0, treinável. O professor Tal Ben Shahar, que criou o curso mais popular de Harvard, diz: “O papel da ciência da felicidade é nos ensinar quais condições podemos colocar em prática para aumentar a probabilidade de crescimento a partir das dificuldades”.

A ansiedade é útil, apesar de desconfortável, estimulando o indivíduo a entrar em ação, porém, em excesso, faz exatamente o oposto, congelando reações e transformando um estado em situação permanente, ultrapassando o efeito da funcionalidade.

Quase ninguém está realmente bem, é como se todos dançassem fora do compasso e alguns não fossem mais capazes de ouvir a música. Pode-se sentir ansioso a maioria do tempo sem nenhuma razão aparente e ter a sensação que nunca se está vivendo no presente, sempre em débito com a hora que o relógio mostra. Nostálgicos buscam nas lembranças alimento para a alma e, embora o presente seja necessário, recorrer aos momentos que congelamos na memória libera acesso para o imaginário tão bem protegido pelo nosso cérebro.

“O mundo está passando por um período de turbulência e incerteza. Quando a vida parece caótica, nossas mentes naturalmente se voltam para experiências mais reconfortantes do passado e não há nada de negativo nisso”, diz o Dr. Clay Routledge especialista em psicologia existencial (The Well). Sem excessos, mas precisamos acessar todo o arsenal que nos faz bem.

Felicidade, às vezes, é só uma questão de equalizar as dores e reduzir o que nos consome a alegria. Gente feliz fica com raiva, triste, ansiosa; mas não fica lá!

Fonte: https://oespecialista.com.br/opinioes/sandra-teschner-felicidade-para-cada-solucao-mais-um-problema-por-favor/